Expectativas são de que número de infectados deve aumentar em progressão geométrica no Brasil, a exemplo de outros países. Especialistas questionam capacidade do SUS de dar conta do impacto.

Como o novo coronavírus pressiona o sistema de saúde.
Em 29 de fevereiro, a Itália registrava cerca de 1.000 casos confirmados de coronavírus e 29 mortes. Uma quinzena depois, eram mais de 15 mil casos e cerca de 1.000 mortes. Entre 9 e 10 de fevereiro, o país registrou 168 mortes, o total mais alto registrado por um país em 24 horas.

Segundo a OMS, o novo coronavírus já afeta 114 países em todos os continentes. Mais de 127 mil pessoas estão infectadas e 4.700 morreram.

Capacidade de atendimento e leitos hospitalares.

A escalada da doença levanta questões sobre a capacidade do sistema de saúde brasileiro, público e privado, de dar conta do atendimento a tantos infectados.

O país tem atualmente 28 mil leitos de UTI habilitados para o SUS (Sistema Único de Saúde). Eles estão concentrados em uma parcela minoritária dos municípios do país. Segundo dados de 2017, cerca de 10% das cidades contavam com esse tipo de leito. Casos mais graves podem demandar uma internação de até três semanas.

Um levantamento do site Núcleo Jornalismo, com base em dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, apontou que o SUS perdeu leitos de todo o tipo de 2007 até o fim de 2019. A queda foi de 14,3%, o equivalente a 49 mil unidades a menos. Enquanto isso, a rede privada registrou um aumento de 18,2%. Contados os dois sistemas, a redução foi de 28.300 unidades, uma diminuição de 6,2%.

“Não temos fôlego extra. Qualquer situação de emergência, o sistema arrebenta”, disse Ederlon Rezende, membro do conselho consultivo da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, em entrevista ao jornal Estado de S. Paulo. O especialista afirmou que leitos da rede pública têm 95% de taxa de ocupação.

Para o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, não há como prever em qual momento a capacidade do SUS se esgotará, pois o país é assimétrico. “O Rio de Janeiro aguenta muito pouco. São Paulo aguenta um pouco mais. O Paraná é nosso melhor sistema, a melhor rede de distribuição. O Acre não tem nenhum caso. O Brasil é um continente”, concluiu.

A duração da epidemia. E a curva de crescimento.

Como o novo coronavírus pressiona o sistema de saúde.

De acordo com Mandetta, o período da transmissão comunitária “vai ser duro. Vão ser mais ou menos umas 20 semanas duras”.

Especialistas têm defendido a importância de “achatar a curva” de crescimento de casos com medidas de controle com o objetivo de reduzir o impacto no sistema de saúde. Trata-se de tentar espraiar o número de casos ao longo do tempo por meio de campanhas de informação, restrições a aglomerações, redução do trânsito de pessoas.

Caso isso não seja bem-sucedido, uma quantidade muito grande de pessoas pode contrair o vírus e apresentar sintomas, levando ao colapso do sistema de saúde. Foi o que aconteceu na Itália e no Irã.

O Brasil está perdendo tempo nesse sentido, disse à BBC Brasil o virologista e professor da USP (Universidade de São Paulo) Paolo Zanotto. “O Brasil deveria ter instituído sistemas de testagens extremamente agressivos e acompanhamento de todos os clusters (focos). Porque, quando há um caso positivo, é preciso correr e testar todo mundo.”

Os parâmetros para quarentena

No dia 11 de março, o Ministério da Saúde publicou a portaria 356, que regulamenta a quarentena e o isolamento no contexto do coronavírus dispostos na lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020.

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, ressaltou em seu Twitter que isolamento e quarentena podem ser “impostos compulsoriamente”, conforme descrito na nova legislação. De acordo com a portaria 356, “caberá [ao] médico ou agente de vigilância epidemiológica informar à autoridade policial e ao Ministério Público” sobre o descumprimento de recomendações.

A questão de eventos e aglomerações

O Ministério da Saúde ainda não recomenda o cancelamento de eventos, manifestações ou restrições ao uso do transporte público, cinemas, shoppings e outros locais de aglomerações. Mandetta criticou a decisão do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), de suspender as aulas das redes pública e privada.

Mas o ministro admitiu que é uma questão de tempo até que isso seja necessário. “Mais cedo ou mais tarde teremos a entrada do vírus e a sustentação [da epidemia]. Pode chegar uma hora, na semana que vem, em 15 dias, em quatro semanas, em que será recomendável parar [atividades]. Para conter a espiral de casos pode chegar uma hora em que teremos que segurar [transporte, fábricas, escolas]”, afirmou na quinta (12).