Em razão de todos os procedimentos e controles legislativos previstos pela Constituição, tem-se como premissa que as normas aprovadas pelo Congresso Nacional estejam em conformidade com o ordenamento jurídico, sendo constitucionais.
Por este motivo a Lei nº 9.868/99 expressamente determina que: (i) decisões liminares que afastem os efeitos de uma norma por inconstitucionalidade, somente devam ser tomadas por maioria absoluta dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF); e (ii) somente há previsão de modulação dos efeitos na hipótese de declaração de inconstitucionalidade pelo STF.
No entanto, de acordo com informações do próprio Supremo, nos últimos cinco anos foram ajuizadas cerca de 850 ações para se discutir a inconstitucionalidade de alguma lei. Destas, aproximadamente cem possuem decisões liminares monocráticas que aguardam aprovação ou não desta decisão preliminar pelo plenário da Corte. Em razão deste considerável volume destas ações, muitas dessas decisões monocráticas aguardam decisão final pelo plenário há mais de oito anos.
Neste peculiar cenário, reside uma das maiores inseguranças jurídicas que aflige tanto os contribuintes, como os órgãos arrecadadores federais, estaduais e municipais.
Citemos a Lei Complementar Federal (LC) nº 157/16 por exemplo, que, no âmbito da chamada guerra fiscal entre os municípios, alterou a competência do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) incidente sobre: (i) administração de cartões de crédito, débito e congêneres; (ii) assistência médica, hospitalar, odontológica e congêneres; e (iii) arrendamento mercantil.
Observe-se, portanto, que com a publicação da mencionada LC, a competência do ISS antes devido em favor dos municípios onde se encontravam os estabelecimentos prestadores, passou a ser devido ao domicílio do tomador dos serviços. Assim, por exemplo, no caso das administradoras de cartões de crédito com aceitação em todo o território nacional, o ISS passou a ser devido, de uma hora para outra, aos 5.570 municípios onde se localizam os tomadores dos respectivos serviços.
Em razão da impossibilidade prática de cumprimento desta obrigação tributária junto a todos estes municípios, foram ajuizadas diversas ações perante o STF para se questionar a constitucionalidade da LC nº 157/16. Diante da evidente urgência e relevância do tema, via medida cautelar em decisão monocrática, nos autos da ADI nº 5.835, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu os efeitos da LC nº 157/16. No entanto, até o momento, ainda não houve convalidação da decisão pelo plenário, como prevê o disposto no art. 10, da Lei nº 9.868/99.
Por sua vez, lastreados nesta decisão cautelar acima, inúmeros prestadores de serviço em todo o país continuam a recolher o ISS em favor do município onde possuem seus estabelecimentos prestadores, e não aos municípios de seus tomadores, como prevê a LC nº 157/16.
Ocorre que o Supremo, ao julgar a Reclamação nº 2.576/SC, já se manifestou no sentido de que, uma vez reconhecida a constitucionalidade da norma, os efeitos desta decisão retroagem e cassam os efeitos de medidas cautelares concedidas anteriormente.
Ademais, com base no artigo 27, da Lei nº 9.868/99, a modulação de decisão proferida pelo STF somente ocorreria na hipótese de inconstitucionalidade da norma.
Assim, apesar dos relevantes argumentos pela inconstitucionalidade da LC nº 157/16, caso o STF venha a ser julgá-la constitucional, não se deve olvidar potencial risco dos contribuintes – que hoje estão amparados por decisão cautelar do próprio STF- serem obrigados a recolher aos municípios de seus tomadores, o ISS que deixaram de pagar em razão da cautelar monocrática, e buscar o ressarcimento do imposto pago durante a vigência da cautelar cassada, hipótese que poderá trazer relevante impacto financeiro, com projeções que poderão retroagir até 5 (cinco) anos anteriores, a depender do trâmite no STF da ADI nº 5.835.
Neste cenário, ainda que existam argumentos para aplicação extensiva ao art. 27, da Lei nº 9.868/99 a fim de modular os efeitos da LC nº 157/16 mesmo na hipótese de sua declaração de constitucionalidade, é importante lembrar que os milhares de municípios que deixaram de arrecadar o ISS em razão da medida cautelar, por seu turno, deverão apontar os graves reflexos aos cofres públicos municipais de modo a neutralizar eventual tentativa de modulação dos efeitos da decisão do Supremo que vier a eventualmente cassar referida medida.
Em razão deste peculiar cenário de indefinição jurídica, com o objetivo de se reduzir os riscos de pagamento em duplicidade do ISS, além dos altos custos financeiros inerentes à eventual repetição de indébito tributário para reaver o imposto pago indevidamente, recomenda-se aos contribuintes estudo para o eventual ajuizamento de medida judicial preventiva, notadamente objetivando a realização do depósito judicial dos valores inerentes ao ISS, atualmente submetidos à decisão cautelar proferida na ADI nº 5.835.
Fonte: SESCON