Reforma Trabalhista

Como amplamente noticiado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao apreciar o REsp nº 1.221.170, decidiu que, para fins de apuração de créditos de PIS e Cofins, o conceito de insumo deve ser aferido de acordo os critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado bem ou serviço para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.

Nesse cenário, parece óbvio que a remuneração paga aos empregados alocados nas atividades econômicas da empresa estariam perfeitamente inseridas no conceito de insumo acima delimitado, o que, consequentemente, permitiria a geração de créditos escriturais de PIS e Cofins.

É certo, porém, que os arts. 3º, § 2º, I e II, das Leis nº s 10.637/2002 e 10.833/2003 vedam a tomada de créditos em relação ao valor da mão de obra paga a pessoa física e à aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento do PIS e da Cofins.

Esse cenário, que proíbe a tomada de créditos por empresas que não terceirizam, viola os princípios da igualdade e livre concorrência

Todavia, a reforma trabalhista, implementada pela Lei nº 13.467/2017, passou a permitir que empresas terceirizem a mão de obra atrelada à sua atividade principal, modalidade de contratação laboral essa que, se implementada, permite a tomada de créditos de PIS e Cofins em relação aos valores pagos à pessoa jurídica prestadora (Solução de Divergência Cosit nº 29/2017).

Noutras palavras, embora as empresas não possam tomar créditos de PIS e Cofins em relação aos dispêndios com os seus empregados alocados à execução de suas atividades econômicas, tal benesse é concedida às sociedades que se valem da nova regra de terceirização e contratam seus funcionários com a roupagem de pessoas jurídicas.

Cremos que esse cenário discriminatório, que proíbe a tomada de créditos para empresas que não adotam a terceirização, escancara violação aos princípios da igualdade, da livre concorrência, da razoabilidade e da capacidade contributiva, todos protegidos pela Constituição Federal, inclusive à vista da possibilidade de pessoas jurídicas do mesmo ramo terem tratamento fiscal diferente em razão de terceirizarem ou não sua mão de obra, critério esse que, a nosso ver, não se justifica.

De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mello, a discriminação não pode ser gratuita ou fortuita, sendo necessário que exista uma adequação racional e lógica que justifique a diferenciação, sob pena de violação ao princípio da isonomia (“O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade”, Revista dos Tribunais, SP, 1978, p. 49).

A título exemplificativo, imagine que se instale no país uma nova empresa que atue no mesmo ramo de atividade exercido por outra pessoa jurídica já aqui sediada. De acordo com as recentes normas trabalhistas, ela poderá perfeitamente contratar mão de obra terceirizada e, consequentemente, além de se exonerar dos conhecidos riscos trabalhistas, descontar créditos para fins de apuração do PIS e da Cofins.

Por outro lado, a empresa que já estava sediada no Brasil, em razão de limitações impostas pela legislação, não pode facilmente adotar esse mesmo desenho de montagem laborativa e, além de seguir exposta às responsabilidades e gravames impostos pela CLT, estará posta em flagrante posição de desigualdade fiscal por não lhe ser autorizada a apuração de créditos escriturais de PIS e Cofins.

Para contratar mão de obra terceiriza e, consequentemente, obter o direito à tomada de créditos de PIS e Cofins, a empresa já sediada no Brasil deverá demitir aqueles empregados contratados pelo regime da CLT e pagar todas as verbas rescisórias. Além disso, não poderá contratar os mesmos funcionários dentro do prazo de 18 meses. Essas exigências acabam por praticamente inviabilizar tal opção.

Não é nova a discussão acerca da tomada de créditos de PIS e Cofins em relação aos gastos incorridos com mão de obra. O Juízo da 5ª Vara Federal de Guarulhos/SP, ao apreciar o Mandado de Segurança nº 0013313-96.2011.4.03.6119, deferiu medida liminar a fim de reconhecer o direto ao aproveitamento de tais créditos.

Embora a referida liminar tenha sido cassada/revogada e na ocasião não tenha sido analisado o tema sob o ponto de vista da reforma trabalhista, o fato é que ela se pautou justamente na violação aos princípios da isonomia, da capacidade contributiva e da livre concorrência.

Assim, nos parece que os arts. 3º, § 2º, I e II, das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003 padecem de “inconstitucionalidade superveniente”, especificamente na parte em que vedam a tomada de créditos de PIS e Cofins sobre os gastos incorridos com a mão de obra alocada às atividades econômicas da pessoa jurídica.

Por Rafael Alves dos Santos

Via Valor Econômico